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Bola da Vez

Cillas Amaral – diretor de Criação da Calia Comunicação

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No início de dezembro, o Ministério da Saúde, estreou a campanha “Marca”, que representou um verdadeiro divisor de águas nas campanhas públicas de prevenção à dengue, zika e chikungunya. Invés de mostrar os procedimentos básicos de prevenção e combate ao mosquito Aedes aegypti, trouxe o conceito “Um simples mosquito pode marcar uma vida. Um simples gesto pode salvar.”

Na campanha, brasileiros que tiveram suas vidas marcadas para sempre por um mal enorme e inversamente proporcional ao tamanho do mosquito. À frente da criação da Calia Comunicação – agência responsável pela campanha – está Cillas Amaral. Nessa entrevista, ele conta sobre o desafio em mudar o discurso nesse tipo de campanha.

Cillas também conta sobre a sua carreira, que começou no Rio de Janeiro, e comenta sobre o porque de um mercado como Brasília, com verbas tão grandes, não receber tanto destaque da nossa imprensa especializada.

VoxNews – A campanha é bem impactante. Quais as principais informações que levaram a agência a chegar à esse conceito?

Cillas Amaral – A primeira foi a constatação de que a população já conhece os procedimentos de prevenção e combate ao mosquito. Uma pesquisa realizada pelo próprio Ministério da Saúde revelou esse fato, deixando claro que uma campanha que viesse reforçar essas medidas seria extremamente redundante. Portanto, era preciso desenvolver uma comunicação mais incisiva, chamando a atenção para gravidade das doenças e a necessidade imediata de combate ao aedes aegypti.

VoxNews – Houve uma parceria entre a agência e o Ministério da Saúde?

Cillas Amaral – Essa parceria é uma constante em nosso dia-a-dia. Especificamente, para essa campanha, houve um movimento muito especial no sentido de encontrar e dar todo o suporte necessário às pessoas que poderiam participar com seus testemunhos reais.

VoxNews – Como foi convencer as famílias a participarem da campanha? Agência e produtora tiveram um cuidado especial com elas?

Cillas Amaral – Foi surpreendente a vontade, a firmeza e a disposição das famílias em participar da campanha. A princípio, houve um certo receio de nossa parte em como convencer as pessoas a tocar num assunto tão delicado. Foi então que tivemos uma grata surpresa. Quem vivenciou a dor provocada por essas doenças tem a consciência clara de que compartilhar suas experiências é a maneira mais contundente, verdadeira e eficaz de evitar que outras pessoas passem por isso.

Só lamento não ser possível apresentar mais do material colhido nessas entrevistas, pois para cada personagem há no mínimo uma hora de duração. Os momentos de gravação desses depoimentos eram como lançar uma bomba de gás lacrimogêneo no estúdio. Ninguém da equipe conseguia segurar as lágrimas diante de testemunhos tão contundentes e reais.

VoxNews – Você começou sua carreira no Rio de Janeiro. Como você chegou à Brasília?

Cillas Amaral – Cheguei a Brasília em pleno 11 de setembro de 2001. Eu havia acabado de sair da Publicis onde havia trabalhado por mais de 7 anos, desde quando ainda era Norton. Fui contratado para fazer um trabalho que duraria apenas um mês na Giovanni, coincidentemente era uma campanha para o Ministério da Saúde. Naquele dia fatídico, eu, assim como muita gente, fiquei com medo do mundo acabar e não poder voltar pra casa. O mundo não acabou, mas Brasília nunca mais me deixou voltar pra casa. A partir do primeiro trabalho com a Giovanni, foram convites atrás de convites para trabalhar em campanhas públicas.

VoxNews – Campanhas públicas permitem “abusar” da criatividade?

Cillas Amaral – Campanhas públicas não permitem abuso nenhum, seja de verba ou mesmo de criatividade. Antes de qualquer coisa, é preciso ter pertinência, ética e adequação ao seu público. Boa parte do mercado publicitário não faz ideia dos contrastes sociais que ainda permeiam esse país. Imagine, por exemplo, o que é fazer uma campanha de combate à tuberculose dirigida a povos indígenas e, ao mesmo tempo, à comunidade da Rocinha, onde há a maior incidência da doença em todo Brasil.

É preciso ter a exata noção de que, na maioria das vezes, a simplicidade da linguagem é muito mais eficaz do que uma mera “sacada”. Isso não significa abrir mão dos recursos criativos. Muito pelo contrário, existem as raras exceções, como as campanhas de doação de órgãos ou de sangue, onde o apelo emocional permite explorar a criatividade com mais liberdade e ousadia. No entanto, é essencial ter essa percepção de adequação criativa à linguagem popular. E, acima de tudo, ter consciência de que você tem em suas mãos uma ferramenta de comunicação que pode salvar vidas.

VoxNews – Agências com sede em Brasília atuam basicamente em campanhas para o governo. Trata-se de um mercado enorme, com grandes verbas. Por que não é tão divulgado?

Cillas Amaral – As campanhas do governo são de utilidade pública e possuem uma linguagem muito específica, cheia de “polices” e critérios próprios para acessar toda população de forma ética, politicamente correta e, assim, cumprir a sua função.

Infelizmente, o mercado publicitário ainda não despertou para essas nuances e enxerga a comunicação pública como um padrão publicitário “menor” em comparação às grandes campanhas de produtos e anunciantes privados. A maior prova desse fato é que nunca foi criada uma categoria específica para a comunicação pública nos grandes prêmios de propaganda. Ao meu ver, é essa falta de percepção que gera essa falta de divulgação.

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