Bia Ambrogi, presidente da Apro+SOM

Na entrevista dessa semana no Bola da Vez, Bia Ambrogi, presidente da Apro+SOM, aborda um tema crucial para o mercado de publicidade: a forma como as produtoras de som são remuneradas e os desafios enfrentados desde a chegada das mesas de compra e áreas de procurement ao Brasil, por volta de 2012. Esse modelo, que introduziu práticas globais sem a devida adaptação às condições econômicas locais, trouxe uma série de impactos negativos, especialmente para as pequenas empresas, como as produtoras de som. Entre os maiores desafios, estão os prazos de pagamento alongados, que pressionam o fluxo de caixa e forçam as empresas a buscarem financiamento externo para cobrir os custos imediatos de produção.

 

Bia também destaca o crescimento de produtoras in house ou que fazem parte de agências de propaganda. “É preciso ter um protocolo de boas práticas e de produção bem elaborados entre as entidades, a ser revistado constantemente, para se estabelecer um ambiente saudável para todo o mercado”, ressalta. Confira abaixo.

 

VoxNews – A Apro+SOM está propondo uma reflexão sobre a forma como as produtoras de som são remuneradas. Como você enxerga a evolução dessa questão desde que as mesas de compras começaram a ganhar espaço no Brasil em 2012? Quais os principais impactos negativos dessa mudança no mercado de produção criativa?

 

Bia Ambrogi – Por volta de 2012, chegaram no Brasil as mesas de compra, as áreas de procurement. Com isso, outras práticas globais foram sendo importadas, como o aumento do prazo nas condições de pagamento, porém, sem levar em consideração as condições econômicas do mercado brasileiro com juros altos. Os prazos de pagamento longos são desafiadores e muito prejudiciais aos fornecedores, especialmente para pequenas empresas como são as produtoras de som que podem enfrentar dificuldades de fluxo de caixa ao esperar um longo período para receber. As empresas são forçosamente obrigadas a buscar financiamento externo para realizar a produção dos seus clientes cobrindo o intervalo entre a entrega dos seus serviços e o recebimento do pagamento.

 

Por sua vez, os fornecedores das produtoras de som são, em grande parte, pessoas físicas que não conseguem esperar mais de 30 dias para o recebimento. A produção publicitária audiovisual lida com um universo de subcontratações e com um grande percentual de custos imediatos, o que deveria ser um argumento suficientemente forte para justificar que as empresas contratadas deste setor deveriam ter a maior parte do pagamento antecipado desde o momento da aprovação do trabalho. No final, muitas vezes, as produtoras acabam focando mais na lógica empresarial e na gestão de caixa do que na criação, inovação e produção. Isso pode impactar a qualidade técnica e artísticas das produções, enfraquece as parcerias comerciais de sucesso e impossibilita a entrada de novos fornecedores que muitas vezes recusam o trabalho por não ter condições de atender. A negociação do prazo se junta ao quanto as produtoras ficam “espremidas” na mesa de compra. Não temos uma tabela mínima referencial ou limite base de orçamento que podemos seguir. Não há um piso respeitado para os profissionais de som. Ficamos desprotegidos sem uma lei que determine um mínimo.

 

VoxNews – A Apro+SOM mencionou que países como o Chile já adotaram regulamentações como o “Pague em 30”, para garantir que as produtoras recebam seus pagamentos em até 30 dias. Quais seriam os maiores desafios e benefícios para implementar um modelo semelhante no Brasil?

 

Bia Ambrogi – Estamos elaborando uma proposta para um Projeto de Lei para que as empresas voltem a receber em 30 dias. Já existem modelos neste formato em outros países como o Chile. Uma atuação de ordem legal frearia esta prática, mas antes, é preciso haver mais diálogo sobre isso, trazendo debates para melhorar a questão no mercado. Como uma empresa bem-conceituada na sua governança, no cuidado ambiental e social não inclui uma boa relação com seus fornecedores, uma relação mais equilibrada? Estamos falando de boas práticas para uma relação saudável de ganha-ganha. O desafio é completar o diálogo e promover a conscientização de toda a cadeia produtiva envolvida, das produtoras de som e imagem, agência, anunciantes etc., inclusive ampliar a conscientização da população em geral para pode trazer luz à problemática, enquanto o aspecto legal caminha para sustentar a mudança desta prática.

 

O trâmite de elaboração de um projeto de lei e sua concretização pode demorar, mas enquanto isso, a movimentação através de conversas entre todas as partes interessadas pode dar início às mudanças.

 

VoxNews – Como você avalia o impacto no mercado audiovisual com a adoção de produtoras in house e o lançamento de produtoras ligadas às agências?

 

Bia Ambrogi – Também é um modelo importado em grande parte. É preciso ter um protocolo de boas práticas e de produção bem elaborados entre as entidades, a ser revistado constantemente, para se estabelecer um ambiente saudável para todo o mercado, já que as produtoras in house nem sempre competem igualmente com as demais produtoras por terem muitas vezes, vantagens financeiras, de negócios e privilégio de informações perante os clientes.

 

VoxNews – Quais são os próximos passos dessa iniciativa e como ela pode influenciar outras áreas criativas da publicidade?

 

Bia Ambrogi – O projeto se estende a todo o mercado criativo e não apenas ao som, portanto, quando efetivado, irá contribuir com a saúde financeira de todas as empresas do setor que se enquadrarem nesta modalidade de serviço.

A Apro+Som está em fase de elaboração, então abriu diálogo com diversos setores, incluindo entidades, associações, deputados e representantes do mercado, para garantir que a proposta de um novo Projeto de Lei reflita as exigências e precisões de todas as frentes. Nosso objetivo é fecharmos esses debates até o final do ano, para poder finalizar a elaboração da proposta com apresentação oficial no primeiro semestre de 2025. Mais detalhes serão definidos nos próximos meses, pois o conteúdo da PL ainda está sendo moldado com base nas colaborações, nas demandas analisadas e no apoio político que influenciam na articulação final.

 

VoxNews – Como você avalia a receptividade dos anunciantes e grandes marcas em relação às propostas da Apro+SOM? Há algum avanço ou diálogo em andamento para garantir condições de pagamento mais justas?

 

Bia Ambrogi – Sempre tivemos uma ótima comunicação entre a Apro+Som, ABA (Associação Brasileira de Anunciantes) e anunciantes. Damos abertura às reuniões e sugestões, à toda mudança que tem o objetivo de melhoria das relações empresariais de boas práticas e saúde financeira dos setores. Os benefícios retornarão ao anunciante que contribuir para uma indústria saudável e de volta aos trilhos da criatividade. Para as grandes empresas multinacionais, exigirá uma reestruturação de processos.  Uma mudança que pode exigir um esforço maior, mas nada inviável, pois elas estão acostumadas à adequação do mercado local no que compete a lei e cultura para exercerem suas atividades.

 

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