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Bola da Vez

Lídia Zuin – planejadora e futuróloga na UP Laboratório de Comunicação

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“As marcas precisam ter uma identidade, precisam ter mais a oferecer.” Essa é uma das frases de Lídia Zuin, pesquisadora e doutoranda em artes visuais na Unicamp, e um dos nomes destacados na nova fase da UP (ex-UP line) e agora intitulada como um “laboratório de comunicação.”

 

Na empresa, liderada por Marcella Mugnaini e Rennê Nunes, Lídia fica de “olho no futuro”, nas mais recentes tendências da comunicação. O interesse por tecnologias e cenários de ficção foram fundamentais para estudar cada vez mais e a canalizar todas habilidades de pesquisa em aplicações dentro do âmbito da publicidade e do marketing. Atualmente, na UP, Lídia atua na parte criativa de pesquisa sempre pensando em transmídia.

 

E ela afirma que qualquer marca, hoje em dia, deve ter um propósito na sua comunicação mas, com um detalhe: “Ninguém quer ouvir a marca dizer que é inovadora ou transparente: queremos exemplos que nos façam concluir isso”, afirma.

 

Confira a entrevista abaixo.

 

VoxNews – Fale um pouco sobre você.

Lídia Zuin – Sou jornalista pela Cásper Líbero, tenho mestrado em semiótica pela PUC-SP e estou fazendo doutorado em artes visuais pela Unicamp. Sou pesquisadora de tendências e planejamento na UP, além de também ser editora do blog UP Future Sight, que conta com um mailing semanal de notícias, do qual sou responsável pela curadoria. Sou pesquisadora da Envisioning e também colaboro com sites como O Futuro das Coisas, O Futuro do Sexo e sou jornalista freelancer. Trabalhei na Rockstar Games e publiquei textos em sites como Versions, Kill Screen, Neon Dystopia, SyFy e Folha de S.Paulo.

 

Como pesquisadora acadêmica, tenho artigos publicados em periódicos e livros, sendo também pesquisadora do grupo Comunicação e Cultura do Ouvir, da Faculdade Cásper Líbero. Como autora de ficção científica, participei de coletâneas de contos e tenho a série de ebooks REQU13M que se transformou em projeto transmídia de alunos da Anhembi Morumbi, no ano passado.

 

Também sou palestrante, tendo participado do TedxMauá deste ano com o talk “Sci-Fi: prevendo o futuro há 100 anos”. Tenho o blog de moda Fiercekrieg, a página de divulgação científica e de ficção científica Ponto Ômega, e costumava fazer também o programa quinzenal de música eletrônica HEXCAST para a rádio online britânica futuremusic, o que me deu oportunidade de trabalhar como DJ em algumas festas em SP. Também já trabalhei como modelo e recentemente me tornei a personagem Luna dos vídeos da FEXco, uma experiência de futurismo e ficção científica para empresas.

 

 

VoxNews – O interesse pela futurologia surgiu como?

Lídia Zuin – Em 2009, fiz uma iniciação científica na Cásper Líbero sobre a animação japonesa Serial Experiments Lain, na qual eu estudei a relação entre as tecnologias e cenários de ficção científica da obra com desenvolvimentos científicos e tecnológicos já existentes. Com isso, tive a oportunidade de organizar o evento Science’n’Fiction em 2010, o qual reuniu pesquisadores, cientistas e grupos de fãs de ficção científica para discutir as relações entre ciência e ficção.

 

Acabei me afastando dessa área durante o TCC e mestrado, tendo me focado em arte e semiótica, porém ainda publicava contos de ficção científica e tinha muito interesse em escrever sobre o tema.

 

Ao voltar da Inglaterra, no ano passado, descobri que havia um evento sobre realidade virtual chamado BRVR que eu gostaria de cobrir para um site para o qual eu escrevia sobre o tema.  Como eu já estudava VR desde a iniciação científica e tomava isso como inspiração também para os meus contos, o organizador me convidou para fazer parte de um painel sobre futurologia junto com a Camila Ghattas e o Ronaldo Gazel. Com isso, descobri que a futurologia já havia chegado ao Brasil e descobri que meu interesse em tecnologia, minha pesquisa e produção de ficção científica faziam parte de um dos braços do future studies, que é a própria ficção científica.

 

Quando comecei a trabalhar na UP, em outubro do ano passado, tive a oportunidade de fazer o curso Friends of Tomorrow da Aerolito, o que me deu mais embasamento para entender que aquilo que eu já fazia em nível acadêmico e literário eram ferramentas a serem aplicadas em pesquisas em futurologia. A partir daí, mais oportunidades de me posicionar como futuróloga foram aparecendo e eu defini que a ficção científica é o meu principal foco ao pensar o futuro.

 

Mas foi bem assim… eu não cheguei do nada e disse “sou futuróloga”, mas as pessoas começaram a me chamar para pesquisas e palestras e eu entendi que meu trabalho se encaixava nessa área.

 

 

VoxNews – Como toda a sua experiência em pesquisa vem ajudando nesse novo posicionamento da UP?

Lídia Zuin – Faço pesquisa acadêmica desde os meus 19 anos, o que me deu uma base metodológica para fazer pesquisa. Mas, confesso que, apesar de existirem ferramentas e metodologias, minha forma de pesquisar é muito mais baseada no “feeling”, por isso que gosto muito de coolhunting, por exemplo. Neste primeiro ano que estou na UP, o Rennê (Nunes) e a Marcella (Mugnanini) me ajudaram muito a canalizar todas essas minhas habilidades de pesquisa em aplicações dentro do âmbito da publicidade e do marketing. Descobri, então, que eu tenho uma certa facilidade em trabalhar com planejamento, por exemplo. Então eu fico mais nessa parte criativa, de pesquisa, por trás dos jobs que fazemos, agora com essa entrega pensando em transmídia.

 

Com o lançamento da nova UP, também resolvemos começar a produzir conteúdo, o que me deu espaço como jornalista para escrever e fazer curadoria de notícias a partir do UP Future Sight. Por enquanto, estamos mantendo esse foco no projeto, mas estamos investindo em algo maior, em um novo serviço da UP, no qual combinamos pesquisa e consultoria estratégica de comunicação para as empresas.

 

 

VoxNews – Hoje o consumidor está totalmente conectado. Como as marcas são afetadas? E como devem atuar neste universo?

Lídia Zuin – Com as redes sociais, é muito mais fácil hoje para o consumidor alcançar a marca, seja para criar um relacionamento mais próximo ou para criticá-la. Esse tipo de exposição é uma faca de dois (ou até mesmo mais) gumes, já que é a oportunidade para a marca se posicionar e criar uma identidade, uma personalidade para realmente conversar com as pessoas, bem como lidar com gerenciamento de crises de forma mais aberta e transparente.

Acho que essa é a questão: as marcas não têm mais como ser uma caixa preta e nem como empurrar para debaixo do tapete algum deslize que tenha cometido. Com mais acesso à informação e a uma enorme gama de marcas e serviços, não tem mais essa de as pessoas serem obrigadas a consumir apenas uma marca para que tenha acesso a determinado produto ou serviço. Então as marcas não podem mais ser genéricas, mas sim se posicionar, definir seu público e a forma como estabelecem a comunicação com essas pessoas. Além disso, já não faz mais sentido as marcas acreditarem que são elas que estão no poder. A maioria dos consumidores não se importa caso uma marca deixe de existir, enquanto que 84% das pessoas que participaram dessa pesquisa da Havas disseram que acham importante que as marcas também produzam conteúdo, não que só vendam um produto ou serviço.

 

Ou seja, as marcas precisam ter uma identidade, precisam ter mais a oferecer. Uma das tendências da publicidade, aliás, é não criar interrupção. O consumidor ou a audiência não quer ser interrompido por uma propaganda que simplesmente diz “compre meu produto”, mas o que aquele produto significa para além de sua função objetiva? O que essa marca pode me oferecer em troca pelo meu tempo de atenção diante daquele anúncio? O que essa marca está efetivamente fazendo para o mundo além de vender seus produtos e serviços? Não gosto de dizer que o consumo se tornou mais “politizado”, mas sim que um posicionamento genérico e generalista já não faz mais sentido. E isso está totalmente aliado à noção do consumo pós-demográfico também, no sentido de que não dá para pensar mais os consumidores em caixinhas demográficas como idade, sexo, renda etc.

 

 

VoxNews – Nesse trabalho, focado em transparência, qual a importância de uma marca ser autêntica em toda sua escala?

Lídia Zuin – Acho que já respondi isso acima, mas é justamente a questão de que não faz mais sentido ser genérico e querer atingir um público generalizado, assim como a ideia da “massa”. Com mais acesso a mais opções, escolher consumir uma marca significa se identificar com ela, com a forma como ela se posiciona, os produtos e serviços que ela oferece e qual é a mensagem por traz disso. Não é tanto o consumidor se achar diferenciado porque consome ou veste determinada marca X ou Y. Se antes as pessoas gostavam de usar um moletom com uma logo enorme bordada no peito, hoje não é esse o foco, mas sim quais ferramentas as marcas podem me oferecer para que eu atinja meus objetivos? Isto é, não é a marca que empodera uma pessoa, mas ela fornece ferramentas e formas de a própria pessoa se empoderar dentro daquele objetivo próprio dela. Vou dar um exemplo… Não é porque eu uso determinado shampoo X para cabelos crespos que eu estou empoderada pela marca que produz, mas sim porque, no momento em que eu decidi fazer a transição do cabelo liso para o crespo, eu preciso de produtos que me ajudem a fazer isso e é aí que as marcas devem entrar: é muito mais trabalhar em favor das necessidades e desejos do consumidor do que criar um produto para criar com ele uma nova necessidade que antes não existia.

Lídia Zuin – Qualquer marca (e empresa) deve ter um propósito e deixar claro para os consumidores?

VoxNews – Sim e não. Talvez uma marca de parafusos não precise fazer um comercial de TV falando sobre empoderamento feminino. É muito mais importante, nesse sentido, que os processos dentro da empresa sejam mais transparentes e inclusivos do que só fazer uma campanha que demonstre esse propósito. Acho que o exemplo da Mercur pode ser interessante nesse sentido. A Marcella participou de uma experiência com a equipe da empresa e escreveu sobre isso no UP Future Sight, comentando que a inovação e o impacto positivo proporcionados pela empresa começam lá dentro, valorizando as relações entre as pessoas. Esse é o ponto. Não adianta fazer uma campanha linda e diversificada se dentro do seu negócio ainda há desigualdade e desrespeito. Talvez seja por esse lado que o propósito deva ser pensado em alguns casos.

 

 

VoxNews – Como você vê esse movimento entre as marcas brasileiras? Pode citar exemplos?

Lídia Zuin – Além desse caso específico e mais internalizado da Mercur, acredito que a Avon e a Skol começaram essa transição no posicionamento das campanhas publicitárias deles, chamando novas pessoas para serem embaixadoras da marca, mas também temos outras marcas que surgiram justamente a partir de um propósito, por exemplo do consumo consciente e da reciclagem, como é a Menos1Lixo da Fe Cortez, ou então o projeto Litro de Luz. A Pipe.Social tem um mapeamento completo de negócios de impacto social no Brasil.

 

 

VoxNews – No momento, transparência e inovação são as “palavras mágicas” para as marcas?

Lídia Zuin – Sim, mas elas não podem ser só “palavras mágicas” que aparecem nos discursos e nas campanhas, mas realmente fazerem parte do mindset e dos processos das marcas, sejam eles internos ou externos. Isto é, trazer a transparência e a inovação para sua empresa não significa criar um núcleo de inovação ou um núcleo de transparência, mas realmente aplicar isso na maneira como você se relaciona com o seu consumidor e na maneira como você produz e entrega, bem como na forma como é feita a gestão das pessoas que fazem parte da sua empresa. Ninguém quer ouvir a marca dizer que é inovadora ou transparente: queremos exemplos que nos façam concluir isso. E lembrando que inovação não necessariamente significa tecnologia, mas sim fazer de uma forma diferente, buscar por algo novo. Por exemplo, se a sua empresa de maquiagem antes não conversava com homens, os quais hoje sabemos que também têm interesse em consumir esses produtos, no momento em que você passa a dialogar com eles você já está inovando… e assim por diante.

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